
LIVRO DO ANO 2016, Público
«Víveres é um livro sobre mantimentos e utensílios, sobre a precariedade e a penúria. As enumerações, frequentes, constituem um catálogo de talheres, louças, panelas, uma fruteira de plástico, uns paperbacks manuseados, um jogo de lençóis, a roupa do corpo. Porque este conjunto de seis sequências encontra o ‘eu poético’ em estado de necessidade, de transição. E a subsistência é uma inquietação desmultiplicada em verbos, sarcasmos, estoicismos. Miguel Cardoso descreve uma vita nuova, como Dante, mas a sua crónica é materialmente e afectivamente disfórica. O sujeito dos poemas vive de amigos, de camas emprestadas, é um forasteiro, um Virgílio descamisado, descontente com o fisco e a lei das rendas e as bolsas de estudo. Os poemas, inventivos e sofridos, aludem a grandes desalinhados como Vonnegut, invocam um Zeus ex machina e assumem um tom vivido, andarilho, quase beatnik. Político como sempre, Cardoso transforma a experiência individual em vivência colectiva, documentando os trabalhos, os dias e as amarguras da classe a que chamávamos “média”. É um lamento, mais do que uma invectiva. E uma defesa da ideia de comunidade, de tomarmos conta uns dos outros.»
— Pedro Mexia
Miguel Cardoso
Miguel Cardoso nasceu em 1976 e cresceu nos arredores de Lisboa. Estudou alguns anos em Londres e voltou. Entre vários outros textos dispersos, publicou cinco livros de poesia: Que Se Diga Que Vi como a Faca Corta (Mariposa Azual, 2010), Pleno Emprego (Douda Correria, 2013), Os Engenhos Necessários (&etc, 2014), Fruta Feia (Douda Correria, 2014) e À Barbárie Seguem-se os Estendais (&etc, 2015). Vive e trabalha em Lisboa.